quinta-feira, 18 de março de 2010

Barcos comerciais comprometem a subsistência de ribeirinhos


A pesca ilegal realizada por barcos comerciais (chamados geleiros), que arrastam suas redes nas regiões de Jauaperi e do baixo Rio Branco, na divisa do Amazonas com Roraima, tem feito com que algumas espécies de peixes, antes abundantes, comecem a desaparecer. O assunto tem preocupado principalmente os ribeirinhos, que são impactados diretamente pela escassez de peixes, já que dependem da pesca para subsistência. As informações são do jornal O Estado de São Paulo.

No ano de 2001, quando os ribeirinhos começaram a perceber a diminuição da quantidade de peixes, um grupo de moradores apresentou, ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), o pedido de que fosse criada uma Reserva Extrativista (Resex) no Baixo Rio Branco-Jauaperi, para dar aos moradores o controle sobre a pesca e o extrativismo na região. O projeto recebeu aval do ministério em 2007 e foi encaminhado à Casa Civil, que o devolveu para o MMA.

Além de prejudicar o meio ambiente, a pesca irregular ameaça a subsistência dos ribeirinhos, que têm no peixe a sua principal, e às vezes única, fonte de proteína. Alguns moradores do local já não encontram mais o pirarucu, o maior peixe da Amazônia, já que a espécie virou coisa rara no entorno da comunidade de Itaquera, que fica a um dia e meio de barco da capital, Manaus.

Em Jauaperi, o peixe ficou tão escasso, que em 2006, os pescadores tradicionais e comerciais fecharam um acordo de “cessar-pesca”, válido por três anos, para dar tempo aos peixes de se reproduzirem. Somente foi permitida, até o abril de 2009, a pesca de subsistência. E mesmo com as invasões dos geleiros no primeiro ano, a estratégia mostrou resultados. Ao fim do período, os moradores tentaram renovar o acordo por mais três anos e não conseguiram.

Em setembro de 2009, os comunitários conseguiram uma liminar na Justiça, proibindo todo tipo de captura de peixes que não fosse para subsistência, até a elaboração de um estudo para determinar quanto de pesca o rio realmente pode suportar. Mesmo tendo 90 dias para concluir a pesquisa, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) não a fez e também, segundo disseram os ribeirinhos ao jornal, não apareceram mais na região para fiscalizar a pesca ilegal.

Com a ausência do instituto, a proibição judicial ficou só no papel, já que os geleiros voltaram a subir o rio para pescar, vindos principalmente dos municípios de Manaus e Novo Airão. Com isso, os peixes voltaram a ser escassos. Moradores afirmam que antes pescavam assim que entravam no rio, e hoje ficam no mínimo três horas na água para conseguir o jantar.

Os barcos comerciais são chamados geleiros porque ficam vários dias no rio e estocam o peixe em bacias com gelo. Esses barcos trabalham com redes em forma de saco, que podem ir de uma margem a outra, fechando completamente o rio. Essas redes, chamadas “capa-saco”, capturam tudo o que estiveram passando pelo caminho - peixe, tartaruga, boto, peixe-boi, jacaré. E qualquer animal com valor comercial vai para o gelo no porão, enquanto o que não tiver serventia é jogado de volta ao rio para morrer.

Na região, existe, além da proibição judicial, o período de defeso, de 15 de novembro a 15 de março, em que a pesca é proibida para proteger a reprodução dos peixes. Mas, os barcos continuaram pescando intensamente nos últimos meses, principalmente durante a noite. De outubro a março, época da “seca” amazônica, os rios estão mais baixos e fica mais fácil encurralar os cardumes, mas quando o rio sobe e invade a floresta, os peixes se escondem entre os troncos e se torna mais difícil pescar, até mesmo para os ribeirinhos.

Ameaças Os moradores que defendem a criação da Resex também sofrem com ameaças constantes, vindas até mesmo de vizinhos da comunidade. Em 2006, um voluntário do Ibama foi morto a tiros no Rio Branco, quando defendia uma praia de desova de quelônios. A caça desse animal é ilegal, mas a carne e os ovos são muito apreciados por moradores da floresta e da cidade.

Outro caso que ficou conhecido no lugar foi o de seu Chico Caetano, da comunidade Floresta, na esquina do Jauaperi com o Negro, que teve sua casa incendiada em 2008. Para ele, a criação da Resex seria uma forma de controlar a pesca na região.

Entre os moradores, nem todos aprovam a criação da reserva, já que ela atrairia a presença do Ibama e alguns comunitários temem ser impedidos de plantar, queimar e cortar o mato. A desinformação é agravada pela demora dos processos de criação da reserva, que gera descrença entre os ribeirinhos. As reservas extrativistas permitem as atividades necessárias à agricultura, desde que feitas dentro de um plano de manejo.


(Envolverde/Amazônia.org.br)

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